“Violência faz parte”, reza um dos personagens que transitam entre os contos de Um dia de domingo. Quando dizemos que algo “faz parte”, nos mais diferentes contextos, em regra está implícita a expressão “infelizmente”. Na prosa retesa de Gabriel Cruz Lima, a expressão “fazer parte” reinaugura o olhar: há coisas que fazem parte, há violências e sujeiras que compõem a vida, e nessa integração está também a possibilidade de ternura, felizmente.
Operando num registro entre a acidez das imagens e o balanço oral da linguagem, os narradores de Gabriel Cruz Lima testemunham e performam as brutalidades que atravessam a experiência. Brincando com o riso da maldade e a selvageria do afeto, Um dia de domingo é todos os dias da semana vislumbrados no vórtice dos recomeços.
No inferno, João Antônio contou a Denis Johnson que o livro de Gabriel Cruz Lima era do caralho. Denis Johnson disse que não sabia português. Não importa, disse João Antônio, ele escreve numa língua inventada, só dele. Gostei, disse Denis Johnson, esses são os melhores. Mas não consigo ler mesmo assim. Não precisa ler, disse João Antônio, é aquele tipo de história que chega ao leitor como chegou no autor: por telepatia. Quer dizer que já li o livro, disse Denis Johnson. Sim, disse João Antônio, o que achou? Achei do caralho, disse Denis Johnson.
Joca Reiners Terron
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